Dojô da Associação de Judô Kenshin na Cobrasma, no centro de Osasco em 1963
A série de personalidades e academias da 7ª DRJ Sudoeste faz parte de um projeto do departamento de comunicação, criado no dia 16 de maio, comandado pelas professoras Cristina Amorim (yon-dan) e Deise Ribas (ni-dan). “A 7ª Delegacia Regional tem uma história de 50 anos e vamos contá-la a partir das associações e dos professores kodanshas que viveram momentos incríveis, fundamentados na resiliência e na dedicação aos propósitos do judô Kodokan”, prometeram elas naquela ocasião.
A Associação de Judô Kenshin, pioneira na região, conhecida como a academia do teto de estrelas, abre esta série. A Kenshin foi fundada pelo sensei Sukeji Shibayama em 1957, porém, sua história começou muito antes.
Nascido no Japão, o professor Sukeji Shibayama aprendeu judô em sua terra natal. Aos 24 anos, imigrou para o Brasil e, trabalhando numa lavoura, notou que a terra parecia rejeitar a violência aplicada com o cabo da enxada. Mas notou que acontecia o inverso quando se esquecia de si e formava apenas um corpo com o instrumento, acompanhando o movimento da enxada. Ao fazer isso, percebeu que o esforço necessário era mínimo. A enxada parecia obedecer-lhe sem que precisasse aplicar muita força. Então, pôde compreender o sentido do kuzushi (desequilíbrio), essência das técnicas do judô que utiliza o movimento de deslocamento do adversário unido ao movimento do próprio judoca, resultando num dispêndio de força bem menor.
A partir disso, Shibayama compreendeu o verdadeiro significado do respeito e da não violência. Assim, decidiu fundar uma escola e recomeçar os treinos de judô, a princípio sem dinheiro e trabalhando como agricultor na chácara da família Menck, em Osasco (SP).
Shibayama trabalhava na lavoura durante o dia e, à noite, tirava terra do barranco com sua família para fazer o tatami. Seu primeiro tatami no Brasil foi a terra cavada por ele e sua família, forrada com um pouco de palha e coberta por uma lona. Vendo a grande força de vontade do jovem Shibayama, a família Menck e outras da colônia japonesa resolveram ajudá-lo, cobrindo com um telhado a academia Kenshin, cujo significado é “manifestação da verdade”. Em 1956, o local funcionava sem cobertura e membros da colônia chegavam a lamentar, em tom de brincadeira, que pertenciam à única academia de judô que tinha o céu como telhado.
O professor Shibayama sempre almejou ter uma academia melhor, mas o constante fracasso na lavoura não contribuía para tal. Após anos funcionando na chácara da família Menck, conseguiu transferir a academia para as instalações da Cobrasma, no centro de Osasco, realizando os treinos na quadra esportiva da fábrica. Neste período, já contava com a participação ativa do professor Paulo Fugio Fukushima. Essa transferência da academia ocorreu junto a seu genro, professor Sadao Doi, professor Takatomo Yokote, professor doutor Siokiti Takimoto e professor Walter Baxter. Posteriormente, mudaram-se para a rua da Estação, onde permaneceram por quase 25 anos, até a área ser desapropriada para dar lugar a edificações públicas.
Desde que fundou a Associação de Judô Kenshin, Shibayama nunca cobrou mensalidades de seus alunos. O professor kodansha fazia isso por entender que, sem cobrar, poderia atingir um público maior para ensinar o judô em sua forma mais pura; portanto, não tinha reservas financeiras para instalar-se em outro local.
Em uma memorável reunião, os diretores, entre eles a família Fukushima e fundadores, juntamente com os atletas mais assíduos, que valorizavam a missão socioeducativa e desportiva do dojô Kenshin, cotizaram-se para comprar o imóvel da Rua Licínio de Castro, 75, atual sede do dojô (uma das poucas academias sem fins lucrativos que possui sede própria). Emocionado com a demonstração de união em torno de um ideal, pela primeira vez o professor Shibayama chorou copiosamente em agradecimento ao gesto. Até o fim da obra da sede os treinos foram realizados na residência do professor Jorge Fukushima.
O princípio ensinado por sensei Shibayama, além daqueles formulados por Jigoro Kano, resume-se num conjunto de palavras japonesas:
Shin: Deus (verdade)
Sei: Natureza
Kaihatsu: Exteriorizar
Shinsei Kaihatsu: Fazer exteriorizar a natureza divina de cada um
Significa que todo homem é filho de Deus, perfeito e saudável, sem mácula e pecado. O método consiste em acreditar que o homem verdadeiro, aquele que habita o fundo da alma humana, é incapaz de pecar e de praticar o mal. Ao enxergar o homem bom e perfeito, este se manifestará.
De acordo com os princípios deixados por Shibayama, todo homem, no íntimo de seu ser, é bom. Não há pessoas ruins, mas apenas pessoas iludidas que acreditam em valores errôneos. Caso as pessoas à volta do homem pareçam más, esse homem também é responsável, pois não está enxergando naquele errante o homem feito à imagem e semelhança de Deus.
Hoje, a Associação de Judô Kenshin continua, por intermédio de seus professores, passando os ensinamentos que partiram de Shibayama. É importante a disseminação desses valores, já que se vive uma época em que os padrões de respeito, dever, honra, humildade e determinação estão distorcidos. Cada criança que o judô Kenshin tem a honra e a confiança de abrigar tem o dever de receber os valores profundos de respeito, caráter, dignidade, união, determinação, convivência, dedicação, solidariedade e amor ao próximo.
Hoje em dia, a associação recebe jovens atletas que podem contribuir eventualmente, mas acolhe igualmente um número crescente de jovens sem condições financeiras que querem e têm potencial para treinar.
Até 2019, a Associação de Judô Kenshin formou 32 sho-dans, oito ni-dans, cinco san-dans, quatro yon-dans e dois go-dans; grande parte continua ensinando na associação. O professor mais graduado, Nelson Shigueki Koh, kodansha 6º dan, iniciou seu aprendizado com o sensei Shibayama há 55 anos e continua ensinando tudo o que aprendeu com seu mestre.
Todos os professores mantêm os princípios deixados por sensei Shibayama, procurando, como voluntários, ensinar o que aprenderam, visando a despertar a natureza divina existente dentro de cada ser humano que procura o dojô Kenshin.
Pioneiros
14 de junho de 2020
Por ISABELA LEMOS I Fotos ARQUIVO 7ª DRJ
Osasco – SP