O diretor Jorge Bicharana sede do COB — Foto: Divulgação / COB
Por Marcel Merguizo — São Paulo
Na primeira quinzena de junho o Comitê Olímpico do Brasil (COB) vai lançar um Manual Técnico do Esporte de Formação e Alto Rendimento em um Ambiente de Covid-19. É assim que o diretor de esportes da entidade, Jorge Bichara, define o documento de 200 páginas elaborado por uma equipe de 20 pessoas, entre médicos e profissionais do esporte, que deve servir de base para outras instituições esportivas na retomada das atividades nos próximos meses.
Em entrevista ao Globoesporte.com, Bichara explicou que o manual apresenta “orientações operacionais, normas de segurança para convívio profissional e a prática esportiva, estudos médicos referentes ao impacto do Covid-19 no ambiente esportivo e um protocolo aplicado para o retorno das atividades no centro de treinamento do Time Brasil, e que pode ser utilizado como base de consulta e referência de procedimentos e recomendações adaptados a outras instalações”.
– O nosso objetivo é compilar informações e oferecer como foco de consulta. Em outros aspectos, preconizar o que o COB conseguiu verificar em outros países o que é válido e importante, como é o caso dos testes – diz o diretor do comitê que cita protocolos do Instituto Australiano de Esportes, do Comitê Olímpico dos Estados Unidos, Comitê Olímpico da Suécia, da Federação Portuguesa de Natação, entre outros, como base para o do Brasil.
A conclusão do documento ocorre na semana em que houve a primeira reunião entre 48 médicos e 30 confederações para discutir apenas aspectos médicos relacionados ao retorno dos treinamentos esportivos no Brasil. O encontro passará a ser semanal.
Em relação à abertura do CT do Time Brasil, onde ficam desde as piscinas do Parque Aquático Maria Lenk até o centro de treinamento da ginástica artística brasileira, dentro do Parque Olímpico da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, o COB diz que seguirá as regulamentações dos governos estadual e municipal. Hoje, não está autorizada a abertura do local, que pode receber cerca de mil pessoas, mas, quando reabrir, na chamada fase 2, terá cerca de 20 atletas no máximo. Lá a entidade bancará os testes recomendados: o de diagnósticos de sorologia, para verificar a resposta imune, e RT-PCR, considerado padrão ouro na resposta ao Covid-19.
“Entrar, treinar e sair. Essa é a linha do manual do COB”
Leia abaixo a entrevista com Jorge Bichara
MÉDICOS
“Nesta semana, fizemos uma reunião que envolveu 48 médicos e 30 confederações para discutir apenas aspectos médicos, validade de procedimentos e tipo de testagem. Falamos de algo que se discute pouco, como os possíveis efeitos que a Covid-19 traz em atletas, porque pode ter comprometimento cardiológico e pulmonar. Já existem estudos a esse respeito. Nos atletas que adquirem o Covid, existe todo um protocolo para trabalhar e identificar quais possíveis sequelas no atleta que está nesse nível alto de performance. Essa reunião foi muito rica, abriu frente de discussão, porque é tudo muito novo. Estamos acompanhando uma série de documentos que têm sido emitidos e alguns até já ficaram ultrapassados, porque outras situações estão surgindo”.
TREINOS
“A questão da retomada é conseguir trabalhar a graduação do retorno. Isso me preocupa muito. O melhor material que vi foi da Federação Americana de Ginástica, o primeiro a recomendar carga de trabalho semana a semana, para também evitar o risco das lesões. Porque a pessoa quando volta, ela não está lesionada, então se sente apto. Os atletas de alto rendimento não estão acostumados a estarem bem fisicamente e passarem por uma interrupção de treino de dois a três meses. Quando isso acontece é por causa de procedimento cirúrgico que passou. Férias no alto rendimento é de duas a três semanas. E às vezes são férias ativas. Existe uma preocupação grande de como vai ser esse retorno. O atleta emocionalmente vai querer voltar e recuperar o tempo que perdeu. Não é à toa que a gente viu oito lesões na primeira semana de retorno do Campeonato Alemão de Futebol. Os esportes coletivos têm ainda mais riscos. Porque tem a questão do jogo coletivo e entrosamento que são perdidos. O futebol naturalmente tem uma pressa grande, a pré-temporada têm duas ou três semanas”.
“O COB vai seguir as determinações dos órgãos de saúde pública, porque isso foi o que a gente viu no mundo inteiro. O mundo inteiro coloca a área médica como dominante dentro do processo. Eles determinam os níveis de liberação, as outras áreas são assessórios, ajudam a controlar”
PROTOCOLO DO CT DO TIME BRASIL
“A ideia inicial era ter um protocolo de retorno das atividade no centro de treinamento do Time Brasil. O que faço na primeira semana, qual sala que vou, qual não vou. Mas isso é pouco. O que temos é um manual. E dentro do manual existe o protocolo para o CT. Nossa intenção é que seja um documento útil para as pessoas. Tem normas de higiene, mas também tem orientações do conselho de fisioterapeutas, do conselho dos profissionais de educação física, as recomendações que eles apresentam, tipos de material de limpeza para diferentes tipos de piso. O manual será um material de consulta. O protocolo vai ser aplicado ao Maria Lenk. E se alguém quiser aplicar no seu clube, na sua entidade esportiva e quer elaborar um protocolo para o seu centro de treinamento, ele pode ver o que o COB fez e se é adaptável à instalação dele. Então chamei de Manual Técnico do Esporte de Formação e Alto Rendimento em um Ambiente de Covid-19. E dentro do manual tem um protocolo. Nele tem até normas de limpeza de ar condicionado. Porque em ambientes fechados vamos ter que seguir à risca a troca de filtros e conservação. É um material principalmente relacionado ao CT, e como vários outros protocolos lançados, está dividido em fases. O que é indicado em cada fase. E as fases carregam uma dinâmica que está relacionada a políticas públicas. Por isso, uma fase pode se estender muito mais do que a outra. Posso ficar meses na fase 2 e semanas na fase 3. Depende de como a política de saúde pública vai determinar ou apresentar os índices de transmissão do vírus”.
REABERTURA
“O COB vai seguir as determinações dos órgãos de saúde pública, porque isso foi o que a gente viu no mundo inteiro. O mundo inteiro coloca a área médica como dominante dentro do processo. Eles determinam os níveis de liberação, as outras áreas são assessórios, ajudam a controlar”.
CONFEDERAÇÕES
“Fomos nas confederações brasileiras e vimos quais delas já fizeram seus protocolos de retorno. Algumas já fizeram, como a Confederação Brasileira de Vela, a de Hipismo, a de Canoagem. A gente foi nas federações internacionais para entender quais fizeram seus protocolos. Não cabe ao COB as especificidades de cada esporte, a gente vai informar que cada um segue sua confederação, sua entidade de prática, de acordo com a modalidade. Informamos que ela busque os protocolos específicos, se não o nosso documento ia ter 1.000 páginas e não 200″.
EXEMPLOS DO EXTERIOR
“A gente conseguiu um material do Instituto Australiano do Esporte, que vai estar no documento, em que ele planilha o retorno para atividades de esportes olímpicos em três níveis, porém, são informações básicas, simples de como seria o retorno. O nível C de todos é o treinamento e competição normal. É uma informação. Mas nada vai superar a especificidade de cada federação nacional ou internacional. Então nosso documento apresenta um link de alguns desses protocolos que achamos mais interessantes. Tem um documento bom da Federação Americana de Wrestling, por exemplo. O que vi pouco foi por enquanto são documentos relativos aos esportes coletivos, vi um da FIBA (basquete) bom, mas tem característica mais de evento. E a gente também vai falar um pouco de eventos”.
DIFERENÇAS ENTRE OS ESPORTES
“Basicamente a questão está ligada à capacidade de deslocamento e isolamento social. Se a sua autoridade local permite isso, você tem capacidade da prática da atividade física. Essa prática vai avançar para um treinamento esportivo e vai depender da regulação do seu estado ou município. Cabe a cada esporte falar se o atleta pode assoprar a bolinha ou se pode limpar a bola de vôlei na camisa. Conversando com o pessoal do tênis, vi que vão ter bolas com identificação com iniciais ou numeral, ou cores diferentes de bolas de tênis de mesa e cada um só pega com as mãos na sua. No manual a gente vai falar também de todos tipos de máscaras, mas cada esporte vai dizer qual usar ou não. O manual é uma compilação de estudos de tudo o que está sendo levantado sobre o coronavírus e os impactos disso no esporte. Mas a particularidade cada esporte vai determinar o seu protocolo, pois o COB não é mais competente que as federações nacionais ou internacionais para dizer como elas devem retomar suas atividades”.
“Nós preconizamos o teste e indicamos quais os tipos de testes o COB recomenda que sejam feitos nesse momento. O COB reconhece que o teste é caro, que não há dinheiro hoje. Mas dizemos que é importante e que se deve buscar todos os meios para fazer os testes nos atletas e profissionais do esporte”
PISCINAS DO MARIA LENK
“Temos exemplos de distribuição de atletas dentro da piscina em cada fase do retorno. Tem um material muito bom da Federação Portuguesa de Natação e outra da USA Swimming também, e dentro das fases de retorno eles identificam a quantidade de pessoas que podem ocupar uma piscina de 50 metros. Isso está no protocolo do CT do Time Brasil, que tem piscinas. Aí tem um desenho de como vai ser na fase 2, na 3, na 4… mas para mais informações sobre natação, procure a CBDA ou a FINA. O clube do Bruno Fratus, na Flórida, por exemplo, abriu com treinamento agendado e ele pode ficar uma hora lá dentro. Já a Federação da Alemanha, que não fechou por causa do coronavírus, deixou os atletas trancados lá dentro. Entraram há dois meses, cada um com três malas, e estão lá dentro, treinando oito horas por dia”.
PÚBLICO
“Retorno das atividades com a presença de público só bem à frente. As recomendações da maioria dos protocolos que a gente leu usam um modelo que é: ‘Entrar, treinar e sair’. Eles tem esses verbos ‘entrar, treinar e sair’. Você não leva ninguém que não tenha a ver com seu treinamento, você se relaciona pouco com as pessoas e adota esse procedimento de entrar, treinar e sair. Essa é a linha do manual do COB”.
COMPETIÇÕES
“Competição se encaixa melhor na fase 5. Possivelmente vamos ver outros modelos de competição, onde o distanciamento é o maior possível. O tênis, de alguma forma, carrega essa possibilidade. Porque os adversários estão muito distantes e eles não se encontram. O atletismo talvez, com competição com distanciamento. Em vez de oito raias corre com quatro ou três. São adaptações para voltar com algum tipo de competição”.
TESTES
“Nós preconizamos o teste e indicamos quais os tipos de testes o COB recomenda que sejam feitos nesse momento. O COB reconhece que o teste é caro, que não há dinheiro hoje. Mas dizemos que é importante e que se deve buscar todos os meios para fazer os testes nos atletas e profissionais do esporte. No CT o COB vai bancar esses testes. Mas há alternativas simples. Eu vi uma que trouxeram de hospital. Um dos sintomas da Covid é a perda do olfato. Então havia um teste do café, se a pessoa sentisse o aroma, odor, ela não tinha esse sintoma . E era um café. Uma sugestão para monitorar sintoma”.
AS 5 FASES
“Fase 1 é desenvolver protocolos e formas de enfrentamento ao Covid. Fase 5 está relacionado ao desenvolvimento e aplicação da vacina para retomada. Acredito que a normalidade só aconteça depois de algum tempo do descobrimento da vacina. Eu sou otimista em relação à descoberta da vacina. A comunidade científica mundial está na busca disso. Nunca tivemos um foco tão grande de órgãos internacionais ligados à saúde na busca dessa cura. Além da competição ocorre uma integração entre esses órgãos pela descoberta da cura ou controle”.
Fonte Globo Esportre
Por Marcel Merguizo — São Paulo