Para o prefeito Alexandre Araújo, além de ser uma excelente prática esportiva, o judô revela-se uma poderosa ferramenta de transformação social © fpjcom
De uns tempos para cá, nome Aguaí vem-se tornando familiar para grande número de praticantes e aficionados do judô. É que a pacata cidade do interior paulista, com pouco mais de 32 mil habitantes, vizinha de Mogi Mirim, recebe a cada ano mais eventos da Federação Paulista de Judô (FPJudô). Só em setembro deste ano foram três: o inter-regional das classes sub 13 e sub 15, o Kangeiko de Aguaí e o Open Ajinomoto Aspirante.
Voltados para as categorias de base, os torneios atraem não apenas os competidores que, por serem ainda crianças e adolescentes, viajam quase sempre na companhia dos pais e outros familiares. O clima agradável, a limpeza dos locais públicos, a qualidade das instalações esportivas e a receptividades dos moradores acabam por fazer das atividades esportivas uma atração turística.
Mas o judô é muito mais do que isso na vida da cidade. Presente como disciplina no currículo de quatro das 18 escolas municipais de ensino fundamental, a modalidade está disponível para cerca de 800 crianças que frequentam os outros estabelecimentos como ação de inclusão social.
O prefeito Alexandre Araújo (PSDB), reeleito em 2020 com mais de 60% dos votos válidos, é o responsável por essa transformação, entre tantas que a cidade experimentou nos últimos sete anos, oferecendo a infraestrutura e buscando apoio da indústria, do comércio de outras esferas do governo. Nesta entrevista, Araújo revela seu perfil político e sua filosofia de gestor público.
Reeleito prefeito de Aguaí em 2020, Alexandre Araújo detalhou quais foram as principais realizações de sua gestão. “Acho que a organização da saúde foi fundamental. No começo do meu primeiro mandato o único hospital da cidade estava fechado havia mais de dez anos. Então, nós montamos um pequeno hospital clínico, criamos o sistema de atenção básica, e hoje com mais uma unidade inaugurada atingimos 100% de cobertura no município. Vale ressaltar que se trata de um trabalho preventivo e, portanto, muito significativo porque reduz a quantidade de pessoas que buscariam serviços especializados e de emergência.”
“Reformamos todas as escolas da rede pública – as duas últimas ainda em fase de conclusão. Adotamos o sistema de ensino do Sesi desde a educação infantil até o quinto ano do ensino fundamental e mantemos uma unidade até o nono ano 100% Sesi. Com isso elevamos sensivelmente os indicadores educacionais do nosso município”, detalhou Araújo
Além dos órgãos de segurança pública de responsabilidade estadual, Aguaí possui hoje, uma guarda civil municipal muito bem estruturada e um conjunto de 97 câmeras capazes de ler placas de veículos, permitindo a identificação dos que sejam procurados ou clonados. Por meio de um painel central podemos controlar todas as entradas e saídas da cidade e suas praças.
“Assim como acontece no esporte, também investimos na área cultural. Nós temos uma oficina de cultura com 13 atividades – música, circo, teatro, canto, mídias digitais, escola de rock, entre outras. Aguaí nunca realizou tantas ações simultâneas em várias frentes”, explicou o prefeito.
Na área social o quadro realmente impressiona. “Hoje Aguaí não tem moradores em situação de rua, o que mostra a eficiência de nossa estrutura de desenvolvimento social. Quando identificamos algum, procuramos a família, oferecemos tratamento em caso de doença. Trata-se de uma ação articulada do fundo social de solidariedade com igrejas, maçonaria, lar da criança, APAE e abrigos. Há uma troca de informações para sabermos quem são as pessoas acolhidas, para que não haja duplicidade de atendimento e os recursos garantam proteção social para mais famílias.”
Como a cidade consegue recursos para tantas ações?
Aguaí gerou nos últimos anos mais de 2.500 empregos, resultado de um grande trabalho para atrair empresas. Mas não bastava trazer indústrias, era necessário capacitar profissionais antes que elas chegassem. O município era essencialmente agrícola, tendo como carros-chefes a laranja e a cana-de-açúcar. Hoje, a maior parte dos empregos formais é industrial. Primeiro, abrimos uma escola de formação em parceria com o Senai, e só quem passa por ela é contratado. Nós montamos a escola, o Senai fornece o conteúdo, a indústria cede o equipamento e até profissionais para o treinamento prático. No princípio os trabalhadores que vinham do campo tiveram dificuldade para se adaptar à rotina de longas jornadas e ambiente fechado, mas o processo de formação a médio prazo deu resultado.
Como o senhor definiu essas prioridades ao assumir o mandato?
No meu primeiro plano de governo eu e minha equipe montamos um plano estratégico com base nos resultados de uma pesquisa prévia sobre as demandas e necessidades da população e sobre o funcionamento da cidade. No primeiro mandato cumprimos 98% do plano de governo e agora já alcançamos 100%. A renda média dos trabalhadores de Aguaí triplicou nos últimos seis anos, segundo a Fundação Seade.
Qual a importância do turismo?
Uma pesquisa feita há seis anos demonstrou que Aguaí não tem vocação turística natural. Revelou também que sua população sofria de baixa autoestima, talvez por não encontrar os serviços públicos de que necessitava, o hospital em particular. Corrigimos isso e Aguaí foi uma das primeiras cidades do interior a receber o Poupatempo, entre outros equipamentos essenciais. Mas percebemos que, para melhorar a autoestima, o cidadão precisava igualmente de interação social – e o turismo seria uma das vertentes para ele conviver com pessoas de fora e experimentar outras realidades. Em nosso processo de pesquisa descobrimos que a cidade é ponto de parada de muitos profissionais ligados à agroindústria que atuam nos municípios maiores da região, principalmente na hora do almoço, e que eles poderiam divulgar a cidade se encontrassem um atendimento diferenciado. Então, contratamos o Senai para formar o nosso comerciante da área da alimentação, como padarias, restaurantes e lanchonetes, pois embora a comida fosse boa, a estrutura deixava a desejar.
O esporte faz parte desse projeto?
Sim, descobrimos que o esporte bem trabalhado seria um vetor de turismo e o investimento no judô, que tinha objetivos socioeducativos, se bem organizado, poderia cumprir essa função. E não tenho dúvidas de que nós acertamos. A parceria com a federação paulista e o estímulo do presidente Alessandro Puglia deram a Aguaí a possibilidade de atrair milhares de pessoas de outras regiões do Estado. E elas levam daqui a imagem de uma cidade organizada, limpa e de um ginásio moderno, motivando comentários favoráveis entre os amigos e futuros retornos. Por isso vamos estruturar mais esse setor, que pode não trazer riqueza imediata, mas consegue espalhar uma imagem positiva da cidade para além de seus limites.
Quantas escolas de ensino público há em Aguaí e em quantas delas há judô?
São 18 escolas e o judô está em quatro como disciplina na grade curricular. Como atividade extracurricular, acredito que em todas as escolas, ou cerca de 700 crianças. A prefeitura fornece todo o equipamento para a prática do judô. A filosofia do Judô, centrada em valores como respeito, disciplina e superação, molda não apenas atletas habilidosos, mas cidadãos conscientes e responsáveis. Ao promover a igualdade de oportunidades e cultivar o espírito de coletividade, o judô se destaca como um agente catalisador de mudanças positivas na sociedade, capacitando indivíduos a enfrentar desafios não apenas nos tatamis, mas também na vida cotidiana. Dessa forma, a prática do Judô não apenas fortalece o físico, mas modela o caráter e contribui ativamente para a construção de comunidades mais justas e harmoniosas.
Como Aguaí se incluiu no calendário da FPJudô?
Quando começamos o projeto do judô, acho que com 15 alunos apenas, os profissionais envolvidos se dispuseram a trabalhar de graça para recuperar o ginásio municipal, que estava interditado. A cidade já vivera uma experiência com o judô e como haveria um evento inter-regional, que eles tiveram a ideia de trazer o Chico (Francisco de Carvalho, então presidente da FPJudô) para conhecer o local e convencê-lo a realizar o evento aqui. No fim a federação concordou em trazer a disputa final, se o prédio estivesse pronto em 30 dias. Era o argumento que faltava para reforma do ginásio e, felizmente, tudo deu certo.
O que será o tão comentado núcleo de formação de atletas para o judô?
Nós estamos formatando um convênio com a FPJudô no qual nos comprometemos a ceder o ginásio e fornecer material para realização de eventos regionais. E a federação cederá recursos humanos para treinamento de atletas não só de Aguaí, mas de toda a região. Não será como o Centro de Excelência de São Bernardo, claro. Ao mesmo tempo, estamos pleiteando do governo do Estado a montagem de um centro de formação regional de judô, natação, vôlei e futebol de salão.
Qual é a contrapartida da iniciativa privada que o judô traz para a gestão municipal?
Nós mantemos uma relação importante com as empresas aqui instaladas. A Unilever patrocina um dos nossos projetos do programa Criança Ativa. As três indústrias de embalagens apoiam ações de incentivo ao esporte. O judô nos possibilita obter financiamento para várias escolinhas que a prefeitura sozinha não teria condições de manter sozinha. O mais importante, porém, são as oportunidades que damos às crianças e adolescentes. A cultura do judô me impressiona pela transformação que imprime na vida dos jovens praticantes, principalmente em relação ao comportamento. Eu já ouvi inúmeros relatos de mães sobre as mudanças nas relações pessoais, familiares e no rendimento escolar.
“O trabalho que fazemos no esporte com ênfase no judô, por exemplo, constitui uma política pública de inclusão.”
Qual é a sua percepção do papel do gestor público focado no desenvolvimento social?
Eu acho que há de se fazer uma mudança comportamental e conceitual do político e do eleitor. O gestor precisa atuar em políticas públicas que promovam a inclusão, reduzam a desigualdade, que ofereçam oportunidades àqueles que precisam. Este trabalho que fazemos no esporte com ênfase no judô, por exemplo, constitui uma política pública de inclusão. Entretanto, os políticos nos últimos anos vêm perdendo qualidade, preocupando-se mais em construir uma imagem nas redes sociais do que em desenvolver ações efetivas. O que eu procuro fazer aqui é mostrar para a sociedade que a ação do político, não necessariamente populista, muda a vida das pessoas. O prefeito que age assim vai desagradar muita gente, vai deixar atender muita gente, mas, se tiver um projeto com começo, meio e fim, que acredite nos resultados dele vai atender à maioria e respeitando a minoria. Quem fizer conceitualmente um trabalho nesse sentido tem tudo para dar certo, e as pessoas vão entender. Haverá obstáculos no meio do caminho, resistência daqueles que estão acostumados com processos diferentes. Para tornar-se uma liderança, o político precisa primeiro mudar o próprio comportamento, porque ele se reflete no eleitor. Se o gestor exibe uma personalidade populista, medrosa, anódina, o eleitor vai tentar tirar vantagem dele, vai aproveitar-se de sua fraqueza. O que eu tenho visto nessa geração mais nova de prefeitos é uma preocupação em obter resultados efetivos, seja na gestão, seja no desenvolvimento e aplicação de políticas públicas que de fato transformem a vida das pessoas.
Sua gestão termina no próximo ano. Como o senhor se sente?
Meu legado é a mudança de comportamento nas relações entre poder público e sociedade. Saio daqui com a certeza absoluta de que ajudei a transformar a vida de muita gente por meio da execução de políticas públicas. Todo mundo foi contemplado? Provavelmente sim, mas o importante é que tentamos atingir uma fatia significativa daqueles que mais precisam. E o judô tem ajudado nisso, principalmente nos dois bairros mais periféricos, nos quais as crianças não têm espaço de lazer, não pratica atividades fora da escola. Quando colocamos essa criança dentro de um sistema em que ela se relaciona com outras, damos a ela uma visão de mundo diferente daquela a que ela está habituada. Eu preciso dar a chance, pelo menos na largada, àqueles que carecem de ajuda. Fazer política pública nesse sentido vale a pena. Não sei ser populista. Prefiro ser aquele prefeito que tem um projeto, que está focado, que sabe onde e como vai chegar, acreditando que está fazendo algumas transformações.
Natural de Campinas (SP) e com formação em administração, com especialidade em gestão pública, Alexandre Araújo possui vasta experiência na gestão pública: